Mais um caso suspeito de racismo foi registrado no futebol brasileiro. No último domingo (20), ao término da partida entre Flamengo e Bahia, válida pela 26ª rodada do Campeonato Brasileiro, o meia Gérson, do Flamengo, surpreendeu a todos ao denunciar, em entrevista à imprensa na beira do gramado, ter sofrido racismo durante a partida. Diante de tantos casos, recorrentes, e apesar de a legislação criminal ser dura contra a prática, há um clima de impunidade no meio esportivo, principalmente no futebol. Por falta de punições severas, a FIFA é cúmplice do racismo.
“Quero falar uma coisa: tenho muitos jogos como profissional e nunca vim falar nada porque nunca sofri esse preconceito. Quando tomamos um gol, o Bruno Henrique ia chutar uma bola, o Ramirez reclamou e fui falar com ele, que disse: ‘Cala a boca, negro’”, disse Gérson, visivelmente abalado, na beira do gramado, ao final do jogo.
Leia também
Garantias devem servir para todos
Causa indignação saber que um mal como o racismo ainda não foi expurgado da sociedade. No esporte, assim como em qualquer outro ambiente, é incabível. E quando digo que a FIFA é cúmplice do racismo no futebol, não falo à toa.
Quantos casos de racismo ouvimos falar nos últimos anos? Vamos relembrar alguns deles.
Em fevereiro de 2014, o meia Tinga, do Cruzeiro, sofreu racismo durante partida contra o Real Garcilaso, do Peru, pela Copa Libertadores. Ele entrou no segundo tempo e ouviu gritos de torcedores do time adversário imitando macacos. Em abril de 2014, quando Daniel Alves defendia o Barcelona, recebeu da torcida do Villareal uma banana à beira do gramado. Em sinal de protesto, comeu a banana.
São muitos também os casos dentro de campo. No início deste mês, em jogo da Liga dos Campeões da Europa, jogadores de PSG e Istanbul Basaksehir decidiram, juntos, sair de campo após um ato racista praticado pelo quarto árbitro contra o ex-jogador e assistente técnico do clube turco, Pierre Webó. E agora, Gérson.
Tomei apenas quatro casos como exemplos, dois vindos da torcida e dois em campo. Tenho certeza de que você que me lê recorda de outros tantos. Agora pergunto, de quantos casos você lembra de atos políticos ou religiosos no futebol? Poucos, creio. O motivo é a política dura da FIFA de combate a esse tipo de conduta. Se não fazem o mesmo com o racismo, é porque não querem.
Duvido muito que o racismo ainda tivesse espaço no futebol se a punição para o atleta pego cometendo atitude racista fosse o banimento do esporte. Excesso? Não. Gravíssimo é atacar alguém por sua cor da pele. Um atleta racista deveria ser punido com seu afastamento definitivo do futebol. Após o primeiro caso de fim de carreira, duvido muito que qualquer outro arriscasse ser racista em tempos onde há câmeras por todos os lados, microfones, e até a possibilidade de leitura labial.
E para os clubes que têm racistas entre seus torcedores? Vale o mesmo: banimento. O clube seria responsável por identificar os racistas e afastá-los para sempre do acesso às partidas. Isso, ou uma punição grave, como perda de pontos na competição até o rebaixamento.
Diante de um movimento social que pede o fim do racismo em todos os ambientes, é fácil para clubes e entidades dizer nas redes sociais que “não basta não ser racista, é preciso ser antirracista”. Virou jargão popular, frase de efeito, mote que de nada vale se não vier acompanhado por atitudes concretas. Combater o racismo é dever de todos, e no caso do futebol, começa por sua entidade máxima.
Texto publicado na edição de 25.12.2020 do jornal A União.