O Relatório Mundial 2021 divulgado nesta quarta-feira (13) pela organização Human Rights Watch, que atua na proteção dos direitos humanos por todo o mundo, acusa o presidente Jair Bolsonaro de ter tentado sabotar as medidas de proteção à população brasileira no enfrentamento à pandemia de covid-19. O relatório também responsabiliza o presidente por diversas práticas criminosas envolvendo as políticas ambientais do governo federal e o desmatamento ilegal na Amazônia. Confira abaixo o trecho em que o relatório incrimina o presidente Jair Bolsonaro.
O presidente Jair Bolsonaro tentou sabotar medidas de saúde pública destinadas a conter a propagação da pandemia de Covid-19, mas o Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso e governadores defenderam políticas para proteger os brasileiros da doença.
O governo Bolsonaro tem enfraquecido a fiscalização ambiental, na prática dando sinal verde às redes criminosas envolvidas no desmatamento ilegal na Amazônia e que usam a intimidação e a violência contra os defensores da floresta.
O presidente Bolsonaro acusou, sem qualquer prova, indígenas e organizações não governamentais (ONGs) de serem responsáveis pela destruição da floresta. Ele também fez ataques a jornalistas.
Em 2019, a polícia matou 6.357 pessoas, uma das maiores taxas de mortes pela polícia no mundo. Quase 80 por cento das vítimas eram negras. As mortes causadas por policiais aumentaram 6 por cento no primeiro semestre de 2020.
O presidente Bolsonaro minimizou a Covid-19, a qual chamou de “gripezinha”; recusou-se a adotar medidas para proteger a si mesmo e as pessoas ao seu redor; disseminou informações equivocadas; e tentou impedir os governos estaduais de imporem medidas de distanciamento social. Seu governo tentou restringir a publicação de dados sobre a Covid-19. Ele demitiu seu ministro da saúde por defender as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), e seu substituto deixou o cargo no ministério em razão da defesa do presidente de um medicamento sem eficácia comprovada para tratar a Covid-19.
O Brasil teve 5,4 milhões de casos confirmados de Covid-19 e 158.969 mortes até 29 de outubro. Brasileiros negros tiveram maior probabilidade do que outros grupos raciais de apresentarem sintomas consistentes com Covid-19 e de morrerem no hospital. Entre outros fatores, os especialistas atribuíram essa disparidade às taxas mais altas de informalidade entre trabalhadores negros, impedindo muitos de trabalharem de casa, e à prevalência de doenças pré-existentes.
O acesso insuficiente a cuidados de saúde e a prevalência de doenças respiratórias ou outras doenças crônicas deixaram indígenas particularmente vulneráveis a complicações decorrentes da Covid-19. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) registrou 38.124 casos e 866 mortes de indígenas por Covid-19 até 29 de outubro.
Em junho, o Congresso aprovou um projeto de lei obrigando o governo a fornecer atendimento médico emergencial e outras formas de assistência para ajudar indígenas a lidarem com a pandemia. O presidente Bolsonaro o vetou parcialmente, mas o Congresso derrubou vetos. Em julho, o Supremo Tribunal Federal ordenou ao governo Bolsonaro que elaborasse um plano de enfrentamento da Covid-19 para povos indígenas.
Com instalações superlotadas, pouca ventilação e cuidados de saúde inadequados, as prisões e unidades socioeducativas no Brasil reuniam condições favoráveis a surtos de Covid-19.
Em dezembro de 2019, mais de 755.000 adultos estavam privados de liberdade, excedendo a capacidade máxima do sistema prisional em cerca de 70 por cento, de acordo com o Ministério da Justiça. As prisões contavam com um médico clínico general para cada 900 detidos e um ginecologista para cada 1.200 mulheres encarceradas.
O governo Bolsonaro não tomou medidas para reduzir a superlotação das prisões, mas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que supervisiona o funcionamento do sistema judiciário, recomendou aos juízes que reduzissem prisões provisórias durante a pandemia e considerassem a saída antecipada de alguns presos. Em resposta à Covid-19, até 16 de setembro, juízes tinham autorizado quase 53.700 presos a cumprirem a pena em prisão domiciliar, de acordo com dados oficiais obtidos pela Human Rights Watch.
Em julho, o presidente Bolsonaro vetou um artigo de um projeto de lei exigindo o uso de máscaras em unidades prisionais e centros socioeducativos, mas o Supremo Tribunal Federal concluiu que o veto não atendeu ao trâmite processual e restabeleceu o artigo da lei. A corte também ressaltou a “precariedade estrutural” das políticas de saúde nas unidades prisionais e socioeducativas em sua decisão.
De acordo com o CNJ, cerca de 46.210 presos e servidores tinham contraído Covid-19 e 205 tinham falecido até 26 de outubro.
O CNJ também pediu aos juízes que reavaliassem as medidas socioeducativas para adolescentes em conflito com a lei durante a pandemia. Após essa recomendação, o número de jovens e adolescentes em unidades socioeducativas caiu para cerca de 14.600, com base em dados de inspeções por autoridades judiciárias obtidos pela Human Rights Watch. Ainda assim, pelo menos 38 unidades do sistema socioeducativo excediam sua capacidade máxima em até 90 por cento em meio a pandemia.
Em agosto, o Supremo Tribunal Federal determinou a juízes que acabassem com a superlotação em unidades do sistema socioeducativo, inclusive aplicando medidas alternativas à internação em meio fechado.
Pessoas com deficiência confinadas em instituições de acolhimento correm maior risco de contrair Covid-19 devido à superlotação e a condições de higiene geralmente precárias, embora a falta de dados centralizados torne impossível avaliar o impacto do vírus. Em maio, a Secretaria Nacional de Assistência Social pediu às autoridades locais que considerassem alternativas à institucionalização e adotassem medidas contra a Covid-19 nas instituições.