A aprovação pela Câmara Municipal de João Pessoa (CMJP) do Projeto de Lei (PL 03/2021), na última quinta-feira (4), proposto pelo vereador Carlão do Bem (Patriota), que estabelece como essenciais os cultos realizados em igrejas criou um problema para o prefeito Cícero Lucena (PP) resolver.
A curva ascendente de mortes e contaminações pela covid-19 na capital tem demandado esforço extra do chefe do Executivo Municipal para ampliar a estrutura da rede pública de saúde e conter o avanço do vírus. Diante dos dados, o caminho da sensatez para Cícero é vetar o projeto da Câmara.
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Essencial é a vida, não os interesses
O projeto foi aprovado quase por unanimidade. Os vereadores alegaram que o trabalho social desenvolvido pelas igrejas havia sido impedido. É mentira dos parlamentares. Na noite anterior à votação, o governador João Azevêdo (Cidadania) veio a público, por meio de vídeo, esclarecer que o trabalho de assistência à comunidade desenvolvido pelas igrejas em momento algum fora interrompido por força de qualquer decreto do Poder Executivo.
O prefeito Cícero Lucena já havia reunido entidades representativas das igrejas cristãs na capital e o assunto, até então, estava resolvido. O arcebispo da Paraíba, do Manoel Delson, havia suspendido as missas, assim como diversos pastores evangélicos têm optado pelos cultos com transmissão ao vivo por meio das redes sociais, visando proteger seus fiéis e a sociedade de modo geral contra a disseminação do coronavírus.
Único a votar contra o projeto, o vereador Marcos Henriques (PT) foi solidário com o segmento, mas manteve sua opinião de que o momento é de preservar vidas. “Queria me solidarizar com empresários, pastores e padres. É preciso uma leitura correta da situação. Esta pandemia tem aumentado o número de vítimas. Ontem [quarta-feira, 3] foram 1840 mortes”.
Para o vereador, a questão não é se contrapor a ninguém, mas sim priorizar o cuidado com a vida, com a população. “A política negacionista muitas vezes é um reflexo da posição central e está provado que essa negação, que se contrapõe até à ciência, está errada. O Brasil já é o segundo no mundo em número de mortes. As divergências acontecem, os pragmáticos e os humanitários precisam ser respeitados. No momento em que mais precisamos de isolamento, isso não está sendo cumprido. Respeito todos os projetos de flexibilização aprovados hoje na CMJP, pois foram aceitos pela maioria, no entanto, eles vão na contramão daquilo que mais prezo, que é a humanização”, salientou Marcos Henriques.
O professor e pesquisador Ramon Nascimento publicou, em seu perfil na rede social digital Facebook, um pedido para que o prefeito Cícero Lucena vete o projeto.
“Com tantas notícias ruins, como se já não bastasse, a Câmara Municipal de João Pessoa, com o uso proselitista de uma religião utilitarista, aprovou hoje [quinta-feira, 4] a essencialidade de atividades religiosas presenciais na pandemia, em dias que as UTIs estão lotadas e o número de mortes só crescendo. Por favor, prefeito Cícero Lucena, vete esse trecho da lei! Sou evangélico sim, mas essa atitude não é nada cristã”, declarou Ramon Nascimento.
Para o pastor da Primeira Igreja Batista de João Pessoa, Estevam Fernandes, o momento é de se ter bom senso. “Milhares de brasileiros estão morrendo. Hospitais cheios, UTIs lotadas. A gente para um pouquinho pelo bom senso. Em prol da vida, em prol da esperança. Bom senso é a capacidade de sair de si e pensar nos outros, e não pensar só a partir de si. Os templos estão fechados, mas a Igreja, não. Nós somos a Igreja! O bom senso diz ‘pare um pouco, para que a vida não pare’. Em nome de Jesus, um pouquinho de bom senso”, apela.