Fique em casa e, se precisar sair, use máscara. O lema vem sendo repetido por governos, autoridades sanitárias e formadores de opinião para que a população brasileira, que não teve acesso às vacinas contra a covid-19 por conta da gestão do governo federal no enfrentamento à pandemia, ao menos se proteja minimamente. Mas não é qualquer máscara que vai oferecer a devida proteção. Pesquisadores da Universidade de São Paulo revelam em novo estudo publicado que as máscaras de tecido oferecem proteção contra o novo coronavírus extremamente variável, podendo chegar a apenas 20%.
Nos países em desenvolvimento, máscaras caseiras com formatos e tecidos variados são usadas diariamente pela população. Estudos científicos indicam que a proteção contra o sars-cov-2 varia significativamente neste tipo de máscara. Por isso, uma equipe de pesquisadores da USP e do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) realizou um extenso estudo com os materiais típicos das máscaras usadas pelos brasileiros, recentemente publicado na revista Aerosol Science & Technology.
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As máscaras caseiras mais comuns utilizam uma ou mais camadas de tecidos de algodão ou tecido não tecido, chamado de TNT. O físico Fernando Morais, que liderou o trabalho, mediu a eficiência de filtração de aproximadamente 300 máscaras faciais, com diferentes combinações de tecidos, e comparou seu desempenho com o de máscaras cirúrgicas e N95. As medidas foram feitas no Instituto de Física (IF) da USP. Os pesquisadores seguem pesquisando a influência do manuseio de reciclagem das máscaras em sua eficiência e apontam que o uso de clipe nasal, embutido na máscara ou não, ajuda a evitar que o usuário respire o ar que entra pelas laterais de alguns modelos, sem passar pelo material que faz a filtragem.
“Essa é a vantagem do clipe, porque a máscara boa é aquela que você vê inflando e desinflando no rosto, significa que todo o ar tá passando pelo filtro e pela máscara, e não pelas laterais.”
Os valores de eficiência de filtração foram medidos produzindo-se partículas de aerossol de tamanhos variados e observando a concentração no ar antes e depois da filtragem pela máscara. Outro fator importante é a respirabilidade do tecido. Um tecido com trama muito fechada pode filtrar muito bem, mas será certamente removido do rosto por quem o utiliza. As medidas de respirabilidade foram realizadas nos laboratórios da Escola Politécnica (Poli) da USP e, junto com a eficiência de filtração, permitiram calcular o Fator de Qualidade (FQ) de cada máscara.
As máscaras N95 apresentaram a maior eficiência para todos os tamanhos de partículas, em torno de 98%, e com bom Fator de Qualidade, e foram consideradas como referência para avaliação de desempenho de máscaras caseiras de tecido. As máscaras cirúrgicas têm uma ótima eficiência, de 89%, e um bom FQ. As máscaras de TNT mostraram uma eficiência média de 78% com um excelente FQ, podendo ser considerado o melhor material para a fabricação caseira de máscaras.
Mas o material mais comumente usado para máscaras caseiras é o algodão, que apresentou uma eficiência de filtração muito variável, entre 20% e 60% e com baixo FQ, portanto, não se mostrando a melhor opção para a confecção de máscaras.
Ainda assim, as máscaras faciais sempre reduzem as gotículas e aerossóis emitidos por pessoas com covid-19, sintomáticas ou assintomáticas, e por isso diminuem a disseminação do vírus.
Entretanto, o resultado do estudo mostra que grande parte da população pode estar utilizando máscaras que não protegem significativamente. O ideal é sempre utilizar máscara, mas preferencialmente que sejam as produzidas industrialmente com padrão N95/PFF2, ou mesmo máscaras caseiras de TNT, desde que muito bem ajustadas ao rosto. É importante também manter o distanciamento social e estar sempre em locais ventilados, para reduzir a disseminação do vírus e proteger a saúde de todos.
O físico aponta que, embora o ajuste ao rosto de alguns modelos de máscara possa influir na vedação e em sua eficiência, seu uso é indispensável, e a pesquisa aponta a importância do uso de clipe nasal, que vem embutido em alguns modelos de máscara, enquanto outros possuem um espaço para ele ser inserido.
“Sem o clipe nasal, a pessoa acaba respirando por onde não deveria, quando se usa uma máscara muito dura, que não deixa passar o ar, ele entra pelo lugar errado, pelas bochechas, pelo queixo, e a máscara não filtra nada”, explica. “Essa é a vantagem do clipe, porque a máscara boa é aquela que você vê inflando e desinflando no rosto, significa que todo o ar tá passando pelo filtro e pela máscara, e não pelas laterais.”
De acordo com Moraes, outras pesquisas do laboratório analisam a influência do manuseio na eficiência das máscaras. “Recentemente publicamos um artigo junto com a Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) que aborda os métodos de reciclagem das máscaras de uso hospitalar, tais como a colocação em fornos para esterilização ou a aplicação de água oxigenada”, relata o físico. “Também há duas pesquisas em andamento, uma que testa a lavagem das máscaras para verificar quantas vezes elas podem ser lavadas sem prejudicar sua eficácia, e outra, sobre o uso de radiação ionizante na esterilização de máscaras, para determinar qual dose é suficiente para que possam ser reutilizadas sem riscos de contaminação.”
O projeto Respire USP é desenvolvido por uma grande equipe multidisciplinar e busca contribuir para melhorar a oferta de máscaras seguras para proteger a população brasileira. Mais informações neste link . O trabalho completo está disponível no site da revista: Filtration efficiency of a large set of COVID-19 face masks commonly used in Brazil.
Fonte: Jornal da USP