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“Qualquer pessoa é um empreendedor potencial”: empresário com 40 anos de experiência fala sobre ‘mentalidade empreendedora’
Termômetro da Política
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Alexandre de Araújo Castro afirma que a mentalidade empreendedora é desenvolvida com a prática dos comportamentos empreendedores (Foto: Divulgação)

“Qualquer pessoa é um empreendedor potencial”. A afirmação parece conversa de coach extraída de um livro de autoajuda, mas quem afirma tem autoridade no assunto. Engenheiro civil formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 1985, mestre pela Fundação Dom Cabral/PUC Minas com trabalho na linha de pesquisa Intraempreendedorismo e Inovação e empresário há mais de 40 anos, 30 destes dedicados à construção civil, Alexandre de Araújo Castro é professor associado da Fundação Dom Cabral, com atuação nas áreas de Estratégia, Inovação e Empreendedorismo.

Além de professor em cursos de pós-graduação, Alexandre de Araújo Castro também atua no mercado como mentor. E por mais que o termo ‘empreendedorismo‘ esteja atualmente muito relacionado com a precarização dos direitos trabalhistas, Castro assegura que uma perda de emprego pode ser o motivo para se começar um negócio de sucesso. “São muitos os casos de empresas bem-sucedidas que iniciaram assim”, afirma.

Em entrevista ao Termômetro da Política, o professor e mentor revela caminhos para se alcançar a tão desejada ‘mentalidade empreendedora’ e avalia possíveis oportunidades, mesmo diante do cenário de grave crise econômica no qual se encontra o Brasil. Para a retomada da economia, Castro acredita que aumento do crédito para o financiamento imobiliário pode ser uma das medidas adotadas pelo governo federal.

Sobre os modelos empregados pela construção civil no Brasil, com alto índice de desperdício, o professor, que tem larga experiência na área, credita parte desse atraso às universidades brasileiras, que, “com exceções, não são centros de excelência no desenvolvimento de novos materiais, processos, equipamentos e tecnologias”.

Ele esteve no Recife no mês passado a convite da H. Forte – Soluções Educacionais e falou sobre o tema “Mentalidade empreendedora e modelagem de negócios” para empresários e executivos de umas das turmas de pós-graduação da Fundação Dom Cabral.

Confira a seguir a entrevista com o professor Alexandre de Araújo Castro:

O Brasil acumula mais de 14,4 milhões de desempregados, o maior número da série histórica do IBGE. Empreender é uma saída para enfrentar a crise e o desemprego?

As motivações para se empreender podem ser divididas em duas: por necessidade (perda de emprego ou renda insuficiente) e por oportunidade (visão de uma oportunidade a ser explorada). Evidentemente que seria desejável que predominantemente as pessoas empreendessem por oportunidade. Entretanto, um evento precipitante como uma perda de emprego pode ser o motivo para se começar um negócio de sucesso. São muitos os casos de empresas bem-sucedidas que iniciaram assim.

Qual é o ponto de partida para se alcançar uma mentalidade empreendedora?

O primeiro passo é entender que qualquer pessoa é um empreendedor potencial. Depois é importante conhecer o seu perfil empreendedor e entender que ele pode ser trabalhado. Finalmente, entrar em ação. Os comportamentos empreendedores e, consequentemente a mentalidade empreendedora, são desenvolvidos com a prática dos comportamentos empreendedores.

Ao novo empreendedor, quais pontos devem ser percorridos para se antecipar a possíveis problemas?

Importante, antes de mais nada, é conhecer bem o mercado no qual pretende atuar.

Qual é o meu público-alvo? O que necessitam, desejam, preferem, não gostam?

Com quais empresas e produtos/serviços substitutos vou competir? Quais suas vantagens competitivas? Suas práticas? Como os clientes os avaliam?

Quem são os meus principais fornecedores? Quais benefícios e riscos cada um me traz?

Como um novo negócio deve se posicionar para criar empatia com clientes?

A melhor maneira de praticar empatia é “calçar os sapatos do cliente”, ou seja experimentar toda a jornada dos usuários. Assim, se pode identificar e sentir todos os pontos de “dores”, o que gostam e qual “tarefa” buscam realizar com um produto ou serviço. Esse mapeamento da jornada também pose se dar por observação e ser complementado com entrevistas.

Como elaborar uma proposta de valor em um novo negócio para se diferenciar no mercado?

Após fazer o mapeamento da jornada, deve ser construído um perfil para cada segmento de usuários, identificando dores, desejos e tarefas. A partir desses perfis é que devemos analisar quais atributos e características a proposta deve conter para ajudar os clientes a realizarem as tarefas, satisfazer seus desejos e curar suas dores. Isso significa fazer um “encaixe” da solução com as necessidades. O próximo passo é desenvolver protótipos (rápidos e baratos) para validar cada parte da proposta de valor e obter novos aprendizados. Assim, estaremos aumentando a assertividade e diminuindo os riscos de um novo negócio.

Como desenvolver um modelo de negócio diante de uma crise econômica generalizada? É tempo de empreender?

O processo varia pouco, independente do cenário. Entretanto, em ambiente de crise como o atual, é importante entender que as necessidades mudam. Assim, é fundamental abandonar as percepções e informações de mercado em situações de normalidade. Tenho um cliente que fornece há anos para uma grande empresa, que sempre preferiu produtos de alta qualidade e preços mais altos. Porém, para preservar o caixa nessa pandemia, passou a comprar produtos menos duráveis e mais baratos. Em todos os cenários, mesmo de crises, existem oportunidades. Basta observar como o lockdown, home office, delivery, e-commerce, aplicativos de entrega, cuidado com proteção e outros, trouxeram novas oportunidades de vários negócios.

A construção civil no Brasil durante muito tempo tinha participação aquém da sua capacidade e da demanda por habitação existente. Até o fim do governo FHC, o crédito imobiliário era de menos de R$10 bilhões/ano. Chegamos a mais de R$170 bilhões/ano, com uma expansão recorde do setor. Após 2016 o país sofreu uma redução significativa no crédito imobiliário e retração na construção civil. Qual a análise que o senhor faz desses fatos?

Com a queda da taxa Selic e a baixa de estoque, após anos de retração, esse mercado tem sido muito beneficiado. Mesmo com a alta no desemprego e com todas incertezas, as construtoras bateram recorde de vendas no ano passado. Acredito que esse movimento ainda vai seguir nos próximos anos.

[De acordo com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBic), em seu balanço divulgado no final de 2020, o PIB da construção civil terminou o ano passado no mesmo patamar de 2007. O documento também mostra que as atividades do setor estavam 36% inferiores ao pico observado no início de 2014.]

Quais políticas podem ser consideradas acertadas ao longo desse percurso e que poderiam ser aplicadas para um processo de retomada?

Entendo que aumento do crédito para o financiamento imobiliário é uma medida fundamental. A construção é uma indústria que tem agilidade de resposta, diferentemente de outras que demandam instalação de parques industriais. Além de geração de emprego direto, movimenta fortemente vários outros setores.

O Programa Minha Casa Minha Vida possibilitou que a construção civil tivesse um novo perfil do construtor como parcela significativa. Pequenos investidores migraram para a construção civil, principalmente no modelo de SPE, em decorrência da abrangência do programa. Qual o balanço que o senhor faz do programa?

Acredito que são bem-vindas todas as iniciativas que buscam financiar, com taxas “humanizadas”, o déficit de habitação da população de baixa renda.

O atual programa Casa Verde Amarela aponta para a mesma abrangência? Qual a sua opinião sobre as novas regras?

Não conheço as diferenças para poder me manifestar.

A construção civil brasileira ainda adota modelos construtivos que implicam em obras com execução lenta e nível elevado de desperdício, quando comparada a outros países. Quais os motivos para que o modelo perdure tanto tempo, quando existem alternativas amplamente utilizadas em outros países, como o steel frame, light steel frame, wood frame, que permitem obras rápidas e limpas? É uma questão cultural ou econômica?

Acho que é uma somatória das duas coisas. Ainda temos poucos investimentos em P&D [pesquisa e desenvolvimento] nessa área. As universidades, com exceções, não são centros de excelência no desenvolvimento de novos materiais, processos, equipamentos e tecnologias. A nossa mão de obra ainda é muito desqualificada. Importar as soluções existentes em mercados avançados muitas vezes é inviável. Por outro lado, ainda temos a mentalidade de começar uma obra sem possuir todos os projetos executivos e especificações.

Qual a análise que o senhor faz da atual condução econômica no Brasil? Ela aponta para expansão significativa da construção civil?

Como disse, acredito que o contexto atual vai favorecer a construção civil por mais algum tempo. Os investidores se viram obrigados a buscar rentabilidade fora do mercado financeiro e a construção civil tem grande atratividade. Particularmente, estou buscando negócios nesse mercado.

Matéria alterada às 17h30 para acréscimo de informações.

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