Uma decisão que impacta empresas que dependem de recursos públicos, mas que estão sonegando impostos, tem movimentado o mercado da Comunicação na Paraíba. Desde abril deste ano, o Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) determina que os veículos de comunicação contratados por entes governamentais no estado devem comprovar regularidade fiscal, ou seja, provar que têm todas suas obrigações com a legislação tributária em dia.
A Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP) já iniciou a cobrança das certidões negativas de débitos tributários e trabalhistas das empresas, afirmando que aqueles fornecedores que não apresentarem a comprovação não terão pagamento liberado. Apenas em 2021, a PMJP já destinou 6,5 milhões de reais para publicidade em blogs, portais, rádios, revistas, televisão, redes sociais, e produção de conteúdo feito por empresas de audiovisual e imagem.
Sites contemplados com a verba pública fizeram um apelo ao TCE, como o “Blog do Dércio” que publicou uma carta aberta destinada aos conselheiros Fernando Catão e Fábio Nogueira [respectivamente, o conselheiro presidente e vice-presidente do TCE], sendo repostada por outros portais paraibanos. Apesar de considerar a determinação “justa do ponto de vista fiscal”, ele critica a decisão e afirma que “não apela por perdão, mas por prazos mais elásticos”, que segundo ele, facilitariam a regularização das contas. O blog recebia 6,5 mil mensais da PMJP desde abril deste ano, segundo o portal da transparência.
Os recursos destinados são para a publicização de ações municipais por meio de banners web em sites, mas também pode vir em formato de comerciais, rodapé de revistas, adesivação e vários outros produtos que comuniquem sobre a prefeitura.
A publicidade das ações do governo estão garantidas na constituição brasileira e, por isso, são destinados recursos públicos para que ocorram campanhas educativas e de orientação para a população. Essas campanhas são muito importantes para incentivar, por exemplo, a vacinação e a participação popular nas tomadas de decisões.
Os recursos são originados do pagamento de impostos que financiam os dispositivos garantidos na Constituição, como o Sistema Único de Saúde (SUS), as polícias, escolas públicas, saneamento básico, programas de moradia e outros. São políticas públicas financiadas pelos impostos arrecadados pela União, Estado e Município. É como investir no governo para receber em troca serviços e benefícios.
O imposto é “uma das modalidades de tributos que são utilizados para fins arrecadatórios”, explica o secretário executivo da Fazenda da Paraíba, Bruno Frade. “Constitucionalmente são receitas não vinculadas, ou seja, o produto da sua arrecadação não tem destino específico vinculado, de tal forma que ele é utilizado para fins de financiamento das políticas públicas governamentais”.
A arrecadação e o custeio dessas políticas esbarra em um crime: o de sonegação fiscal. A lei criada em 1965, sancionada durante a ditadura militar pelo então presidente Castello Branco, define que prestar declaração falsa, omitir informação ou qualquer outra forma de fraude, com a intenção de não pagar tributos, taxas ou adicionais, é crime com pena de detenção de seis meses a dois anos e multa de duas a cinco vezes o valor do tributo sonegado.
“É importante entender que a não arrecadação, como a sonegação, ameaçam os dispositivos que estão na Constituição e tentam garantir para o cidadão uma estrutura que corrija as desigualdades de oportunidade”, argumenta economista Bruno Frascaroli.
O secretário acredita que a sonegação fiscal deve ser tratada de forma tão séria quanto a corrupção, uma vez que ela impede que os recursos cheguem até os cofres públicos. Frade afirma ainda que a prática pode ser até mais prejudicial que os crimes como homicídio, furto e latrocínio, por exemplo.
“Imagine o que seria do poder público sem os recursos arrecadados mediante os impostos, não podendo financiar as políticas públicas, como as de saúde e segurança pública. A gente está falando de um ato ilícito, que pode gerar um dano de sangue muito maior do que os próprios crimes de sangue”, analisa o secretário executivo.
O economista Bruno Frascaroli entende que compreender a estrutura tributária é fundamental para construir na população uma consciência cidadã, no sentido de cuidado com os bens públicos e esforço social, contribuindo inclusive para a denúncia de práticas criminosas como a sonegação. “Compreender esse assunto é extremamente importante para que, inclusive, o cidadão consiga acompanhar o debate a respeito da Reforma Tributária”, acrescentou o doutor em Economia, que disse acreditar que a população deva ser incluída na discussão.
A decisão do TCE é referente a um processo de 2014, que analisava a prestação de contas anuais da Secretaria de Estado de Comunicação Institucional (Secom-PB) durante o ano de 2013, quando a deputada estadual Estela Bezerra (PSB) era secretária. O Tribunal julgou as contas irregulares e aplicou uma multa equivalente a 6,5 mil para a parlamentar por “infração grave à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial”. A quitação da multa foi realizada no dia 31 de maio.
O TCE também determinou que a atual gestão adote maior transparência para contratar empresas de comunicação, como processo de seleção interna entre as contratadas, exigência de nota fiscal, descrição dos serviços e maior especificação da despesa empenhada. Outras determinações para a Secom-PB dizem respeito a redução do número de servidores cedidos a outros órgãos e a proibição de pagamento para blogs e portais sob responsabilidade de agentes públicos estaduais.
Os autos do processo foram discutidos em uma reunião dos membros do Tribunal de Contas, que concordaram por unanimidade com todas as determinações. A decisão foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do TCE-PB no dia 6 de abril de 2021.