A decisão parece óbvia e pode recolocar o entendimento jurídico de que cabe a quem acusa o ônus da prova de volta ao eixo da legalidade no Brasil. Desde os tempos da Operação Lava Jato, a relação entre Justiça e delatores fugia da normalidade. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, trancou a ação penal em que o Ministério Público Federal (MPF) imputava ao prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, os crimes de fraude a licitação, falsidade ideológica e corrupção passiva na contratação de obras para as Olimpíadas de 2016. Na época dos fatos, Paes também ocupava o cargo de prefeito da capital fluminense.
Para o colegiado – que reformou decisão monocrática do relator, ministro Sebastião Reis Júnior –, faltava justa causa para a ação penal, tendo em vista que as informações do colaborador – elemento principal que embasou a denúncia – não foram sucedidas de investigação policial ou de diligências do MPF para verificar a veracidade das alegações.
De acordo com a denúncia, houve simulação em processo licitatório destinado a selecionar empresas para obras de vários equipamentos olímpicos, o que teria frustrado o caráter competitivo do certame. A seleção prévia do vencedor da licitação – o Consórcio Complexo Deodoro – teria ocorrido, segundo o MPF, mediante solicitação de propina pelo prefeito.
Em revisão de sua decisão monocrática, o ministro Sebastião Reis Júnior lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, a colaboração premiada tem natureza jurídica de delatio criminis, pois é mero recurso de formação da convicção, e não elemento de prova – sendo insuficiente, portanto, para subsidiar a condenação do acusado.
Com base nas informações juntadas aos autos, o relator apontou que há fragilidade dos elementos que acompanharam a denúncia em relação ao prefeito Eduardo Paes. O ministro destacou que, após as declarações prestadas pelo colaborador, não foi realizada outra diligência investigatória para checar a sua autenticidade.
Em seu voto, Sebastião Reis Júnior também ressaltou que, nos termos do artigo 4º, parágrafo 16, inciso II, da Lei 12.850/2013, é vedado o recebimento de denúncia com fundamento apenas nas declarações do colaborador.
“Verifica-se que as informações do colaborador, no caso, não foram sucedidas de investigação policial ou do Ministério Público quanto à sua veracidade, não sendo, então, suficientes para evidenciar a justa causa para iniciar a ação penal”, concluiu o magistrado ao determinar o trancamento da ação penal em relação ao prefeito.
Fonte: STJ