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Turismo de base comunitária impulsiona economia criativa na Paraíba
Laura de Andrade - sob supervisão de Felipe Gesteira
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Locais que integram o atrativo turístico dos seus empreendimentos ao trabalho mútuo de uma região que se beneficia diretamente com as trocas proporcionam grande impacto em toda a comunidade. É o chamado Turismo de base comunitária (TBC), um modo desenvolvido em escala local e fomentado pelos próprios moradores, que passam a se articular para oferecer e consumir os produtos produzidos pela comunidade em que vivem. Os benefícios são coletivos, e vão desde a economia sustentável, vivência intercultural e valorização da própria história.

O TBC pode ser vantajoso tanto para os moradores locais de determinado local, quanto para os turistas. O modelo tem características diferentes do turismo de massa, e tem crescido bastante na procura entre os destinos. A conservação e valorização da cultura e do meio ambiente é uma preocupação em especial do turismo de base comunitária, diferente do turismo massivo. Sua principal característica é o protagonismo da comunidade, que tem poder de decisão e fornece o necessário para movimentar a economia da região.

Nevinha, filha de dona Luísa e sua parceira de negócios na Doces Tambaba (Foto: Reprodução/Instagram)

Joelma Abrantes é professora e pesquisadora de Turismo e Hotelaria na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A docente costuma levar seus alunos para conhecerem a Doces Tambaba, referência de empreendedorismo no município de Conde, Litoral Sul da Paraíba. O objetivo é inspirá-los, bem como motivá-los a não desistirem dos próprios sonhos. Para ela, o TBC é fundamental para a sustentabilidade do turismo. “Eu tenho estudado sobre Turismo há pouco mais de 20 anos e hoje acredito num tipo de Turismo que beneficie primeiramente a comunidade, que é o que chamamos de Turismo de Base Comunitária. Não sendo dessa forma, a sustentabilidade desse Turismo fica muito comprometida”, defende a professora.

A professora destaca que o turismo de base comunitária também ressalta a autoestima da comunidade, de forma a valorizar cada vez mais a história pessoal de cada um, além de fortalecer a sua identidade e cultura. “Eles começam a perceber que tem gente que vem de longe conhecer o local onde eles vivem. Então passam a olhar para o que são com olhos mais generosos. E é lindo ver esse processo de empoderamento dessas comunidades”, disse. 

Uma história repleta de determinação

Foi na beira da estrada que Dona Luísa Bento e suas filhas começaram a venda de seus produtos, à época, doces e frutas. Depois, a determinação à base sólida de barro, concretos e ripas de madeira deram vida à casa de taipa que mais tarde traria o sucesso e o sustento da família com o empreendimento Doces Tambaba, localizado no primeiro ‘shopping rural’ do Brasil. São produções de doces caseiros, cachaças artesanais e peças de arte que compõem as mercadorias à venda e movimentam até mesmo o turismo local, além de beneficiar toda a comunidade ao redor.

“Aqui, o maracujá é o meu tio que traz para a comunidade. O coco é do sítio do meu pai. Mas como não dá conta da produção, nós recebemos da comunidade de Pitimbu”, disse a filha da matriarca, Nevinha Silva.

Dona Luísa e Nevinha começaram os negócios com apenas R$ 50 emprestados. Hoje, contam com o movimento de mais de 500 pessoas por dia no chamado Shopping Rural, local que reúne o empreendedorismo de toda a sua família e gera renda não só para dentro de casa, como para toda a região.

Primeiro Shopping rural e o fomento ao turismo no Conde

O shopping existe há quase dez anos. Para cada uma das cinco filhas de Dona Luísa, há pelo menos uma loja administrada. E cada estabelecimento faz parte de uma casa de taipa, que já somam cerca de dez unidades. “Uma tem artesanato, outra, a moda praia; tem a casa da fruta, sorveteria, a biju-taipa, casa do doce e a casa da tapioca e a ‘vem que tem’”, disse Nevinha, filha e parceira de dona Luísa.

O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas na Paraíba (Sebrae-PB) contribuiu com as orientações técnicas necessárias para somar no desenvolvimento do empreendimento, levando em consideração, também, o potencial turístico da região.

“O nosso propósito vai além de cursos, capacitações, consultorias. O nosso propósito é promover o desenvolvimento integrado nos territórios, e promover esse desenvolvimento sustentável é promover o desenvolvimento cultural, é desenvolver o socioambiental e, claro, desenvolver o crescimento econômico […] Com o turismo de base comunitária, nós conseguimos preservar a identidade, as tradições, a cultura, os saberes, os sabores, o meio ambiente. É promover desenvolvimento territorial, desenvolvimento local e integrado nos territórios. E preservar a cultura de um povo”, disse Madalena Arruda, gerente regional no Sebrae-PB.

Para Nevinha, o apoio foi fundamental para movimentar o turismo do Conde, localizado a 21 km de João Pessoa, incluindo as praias de Tambaba e Coqueirinho. “Foi com a história dessas duas mulheres que começaram com apenas cinquenta reais e dois tipos de doces, duas mulheres negras, que nem sabem ler, nem escrever [que o turismo da região cresceu]”, disse. E finalizou: “O Sebrae acreditou na nossa história, e no nosso projeto”.

Saber de onde vêm os insumos que produzem os doces é uma curiosidade dos turistas (Foto: Reprodução/Instagram)

“Para mim, aquelas mulheres não aproveitaram uma oportunidade, elas criaram as suas próprias oportunidades a partir do sonho da Dona Nevinha […] Ela e sua mãe, inclusive, são analfabetas e começaram com R$ 50 emprestados. Então foram muitos obstáculos superados, não é verdade?”, indagou Joelma.

A secretária de Turismo do Conde, Marília Melo, disse que a prefeitura da cidade tem realizado investimentos na área do turismo, não só no assentamento, como em toda a região, além de trabalhos de capacitação, qualificação e treinamento em parceria com o Sebrae. “Os artesãos estão fazendo um trabalho de desenvolvimento de imagem que vai se referir ao município do Conde, e estamos fazendo também o portal de entrada que era um sonho da comunidade, um sonho de Nevinha, de dona Luísa”, afirmou.

A comunidade do assentamento Tambaba onde fica localizada a Doces Tambaba envolve não apenas o trabalho da família de Dona Luísa. “Os fornecedores da região que ofertam os insumos para os doces, como coco, abacaxi e leite, por exemplo, também são beneficiados”, comentou Joelma. Outras famílias também aproveitam a oportunidade que o shopping rural oferece, e também abriram restaurantes na região. Para a professora, o “local integra o atrativo turístico que é o Litoral Sul da Paraíba e isso impacta toda a região, certamente”.

Boqueirão e o turismo de base comunitária

No distrito do Marinho, localizado no município de Boqueirão, a 45km de Campina Grande, encontra-se o Lajedo do Marinho, riqueza natural predominante onde o turismo de vivência é explorado pela própria comunidade, que se organizam em formato de associação. Lá, há uma grande área destinada para os visitantes que optam por acampar e contemplar as belezas da natureza, com oferta de refeições e passeios para desbravar a região.

Seja os insumos para a produção, ou os artefatos para a confecção: o máximo da produção é, como princípio, comprado dentro da própria comunidade. Seu Arthur Manoel, representante da associação responsável por gerir os serviços do Lajedo, tem um quintal produtivo de ovos, queijo, e até mesmo a fruta da goiaba que faz o doce servido no Lajedo.

“Todos na associação têm uma função. Tem nós, aqui, os condutores, tem o pessoal da alimentação, tem o pessoal do crochê, o pessoal do doce, do queijo” São em média 25 famílias que trabalham e contam uns com os outros. “Com isso, nós conseguimos gerar renda”, disse Edriano de Araújo, membro da associação de moradores locais. Por vezes, a comunidade deixa de comprar itens em quantidades maiores nos grandes mercados para consumirem em uma maior frequência do pequeno produtor.

Área de acampamento do Lajedo do Marinho à noite (Foto: Reprodução/Instagram)

“Aqui, a renda não fica na mão de uma única pessoa […] alimenta-se toda uma cadeia dentro da comunidade, desde o mercadinho que a gente compra alguns produtos, ao seu Erasmo, dos Canudos, que a gente compra todas as hortaliças, feijão verde, diretamente com ele, porque ele é um produtor orgânico”, finalizou Edriano.

O Lajedo do Marinho conta com a opção de acampamentos, trilhas, cafés da manhã, recanto para repouso, além da presença do trabalho das crocheteiras do município, pinturas rupestres e diversas outras riquezas naturais. No ano de 2014, o Sebrae-PB apoiou os serviços oferecidos no distrito do Marinho e interferiu, positivamente, no crescimento dos negócios.

A Prefeitura de Boqueirão, que estabelece parceria com o Sebrae-PB, enfatizou que apoia as iniciativas do Lajedo do Marinho, tem um olhar carinhoso ao trabalho da comunidade, além de ótimas intenções para desenvolver o turismo da região. “O impacto de desenvolver o turismo do Lajedo é só positivo. Temos esse olhar especial para a região. A prefeitura colabora por meio da acessibilidade ao local, como melhorias no asfalto, apoio logístico, de transporte e apoio ao artesanato local, por exemplo”, disse o prefeito de Boqueirão, Marcos Freitas.

Busca por experiências

Desfile de pescador no açude Boqueirão durante a 1ª Festa do Peixe, em Boqueirão (Foto: Laura de Andrade)

A professora e pesquisadora Joelma Abrantes acredita em uma tendência no mercado turístico atual que envolva experiências diferentes das comuns, passando pela crescente valorização da cultura e costumes da comunidade. “Conhecer o ‘primeiro shopping rural’ do Brasil, com toda sua singularidade sob a sombra de um cajueiro, experimentando doces produzidos ali mesmo, cachaças e licores com nomes inusitados, tomar uma água de coco que você só paga o canudo, fazer fotos em plaquinhas coloridas com frases divertidas  permitem a esse visitante uma vivência diferente e, talvez, algumas risadas”, aponta.

Para Regina Amorim, gestora de Turismo e Economia Criativa do Sebrae-PB, o “turista atual não compra produto, compra experiências únicas, inusitadas e mais imersão cultural, com responsabilidade social e ambiental”. A gestora ressalta também a importância dos líderes locais para o sucesso desses empreendimentos com base na economia criativa.

“Em todas essas comunidades a liderança é fundamental no processo de desenvolvimento local sustentável do território. As lideranças são agentes de mudança, que transformam seguidores em líderes e de forma coletiva, priorizam as necessidades do lugar e de quem mora nele”, disse Regina Amorim.

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