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‘Tarifaço’ de Trump pode elevar exportações chinesas para o Brasil; entenda
Termômetro da Política
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A ameaça constante de novas tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem gerado preocupação na indústria brasileira para os próximos meses. Além dos impactos diretos, como o aumento de taxas sobre produtos brasileiros, especialistas alertam que essas medidas podem ter efeitos indiretos, afetando os parceiros comerciais do país.

A constante ameaça de criação de novas tarifas de Trump (à dir.) tem deixado a indústria brasileira preocupada (Foto: Instagram/Reprodução)

Um exemplo é a possível escalada da guerra comercial entre EUA e China, que ganhou força após Trump sinalizar a intenção de impor tarifas elevadas para proteger a indústria americana da concorrência externa.

No final de janeiro, o presidente americano anunciou uma tarifa adicional de 10% sobre produtos chineses importados pelos EUA. Em resposta, a China também elevou as taxas sobre produtos americanos.

Nesta semana, Trump mencionou que um novo acordo comercial com a China “é possível”.

De acordo com especialistas e representantes da indústria ouvidos pela reportagem, o aumento das tensões entre os dois países pode levar a China a fortalecer suas relações comerciais com outras nações, como o Brasil.

Esse movimento não seria novidade. Segundo Marcos Jank, professor sênior e coordenador do centro Agro Global do Insper, a China já se preparava para uma nova guerra comercial com os EUA e agora adota uma abordagem mais estratégica, cautelosa e seletiva sobre o comércio mundial.

“Nos últimos anos, a China diversificou bastante suas exportações, já sendo bem menos dependente dos EUA do que era em 2017. E ela tem buscado também uma maior aproximação dos emergentes”, afirma.

Se essa tendência se confirmar, a presença de produtos chineses no mercado global deve aumentar consideravelmente. No último ano, por exemplo, a China foi responsável por 24,2% das importações brasileiras. Um crescimento excessivo desse percentual exigirá uma resposta da economia e da indústria nacional.

Impactos para a indústria

Por um lado, e em um prazo mais curto, especialistas apontam que a maior presença da China no Brasil pode reduzir os custos para os consumidores. Isso ocorre porque a entrada de produtos chineses a preços mais baixos força a indústria brasileira a diminuir seus preços para manter a competitividade no mercado.

“O que acontece na prática é que a China já vem praticando preços muito abaixo dos preços de mercado em diversos segmentos. Vemos um ‘dumping’ de produtos chineses no Brasil, mas isso tem prejudicado a produção local”, diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), Flávio Roscoe.

Nesse contexto, embora os consumidores possam se beneficiar de preços mais baixos inicialmente, representantes da indústria alertam que os efeitos sobre a economia e as cadeias produtivas podem ser negativos no médio e longo prazo.

Esses impactos negativos seriam mais evidentes em setores onde a China tem investido fortemente, como a indústria de máquinas e equipamentos, indústria têxtil e de confecção, além da indústria automobilística.

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De acordo com José Velloso, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), esse movimento já está afetando o faturamento e o crescimento da indústria brasileira.

No setor de máquinas e equipamentos, por exemplo, ele explica que houve uma queda de mais de 8% no faturamento em 2024, enquanto o volume de importações aumentou 10% no mesmo período. Dentre os produtos importados, houve um crescimento de 33% nos itens chineses que chegaram ao país.

“Esses já são os efeitos da guerra comercial entre Estados Unidos e China. E, nesse caso, o aumento das importações não são um bom sinal para a produtividade porque o consumo do setor também caiu”, explica Velloso, indicando que esse quadro também indica uma piora das vendas de produtos brasileiros.

Essa situação também é observada nos outros dois setores, que há algum tempo buscam um ambiente com regras claras de competitividade no país. Um exemplo recente foi a discussão em torno do chamado “imposto das blusinhas”.

A cobrança de um imposto de importação de 20% para compras de até US$ 50 feitas no exterior começou em agosto do ano passado, após mais de um ano de negociações no governo.

A medida era amplamente defendida pelo setor têxtil, que buscava uma isonomia tributária e regulatória, diante do crescimento de plataformas como Shein, Shopee e AliExpress.

Para Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção, o aumento das tarifas pelos Estados Unidos reacende o alerta para uma possível “concorrência desleal” no setor.

“Estamos sempre trabalhando em conjunto com os órgãos de controle das nossas fronteiras, e não só para importações convencionais, mas também para exportações que vêm pelas plataformas digitais internacionais, para garantir que todos estejam pagando os devidos impostos, assim como nós”, diz.

Impacto na taxa de câmbio

Além dos efeitos decorrentes da maior presença da China, representantes da indústria também enfatizam os impactos de um dólar mais valorizado, em meio às tarifas impostas por Trump.

Essas medidas podem elevar os custos de produção para as indústrias que dependem da importação de matérias-primas, além de aumentar as taxas de juros no país e afetar setores que dependem do acesso dos consumidores ao crédito, como a indústria automobilística, por exemplo.

Impacto macroeconômico

Especialistas e representantes do setor ouvidos pela reportagem também destacam que o possível aumento no volume de produtos chineses no país pode gerar impactos macroeconômicos no longo prazo.

“A primeira consequência disso tudo é a desindustrialização, porque se há produtos mais baratos vindos da China, eu vou importar. E isso já está acontecendo agora, com várias empresas anunciando grandes números de demissões”, afirma Velloso, da Abimaq.

Nesse caso, além da queda no faturamento de diversos setores da economia brasileira, há também o risco de aumento no desemprego e de redução nos investimentos no país.

Um exemplo desse cenário é o setor de fabricação de geradores eólicos. O segmento, que chegou a contar com sete fabricantes no país, hoje possui apenas três.

Diante disso, parte das demandas atuais dos representantes da indústria brasileira é a criação de uma agenda focada em aumentar a competitividade do Brasil no exterior.

“A verdade é que nós não temos que ter apenas uma agenda contra aqueles que usam de mecanismos inadequados, mas também precisamos cuidar da nossa agenda de competitividade, para que também possamos aumentar nossa presença nos mercados internacionais”, diz Pimentel, presidente da Abit.

O que esperar para os próximos meses?

Com uma série de medidas anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, a avaliação dos executivos ouvidos pela reportagem é que os próximos meses ainda reservam muitas incertezas, especialmente em relação aos possíveis impactos diretos e indiretos no Brasil.

“Há um risco de desaceleração mundial da economia, muita instabilidade e insegurança que podem acabar impactando diretamente o mercado brasileiro”, diz Leite, da Anfavea.

Ele ressalta, porém, que o país também tem grandes oportunidades à frente, que podem trazer resultados positivos para a indústria.

“O Brasil tem uma oportunidade muito grande de estreitar a relação com os principais países, podendo aproveitar esse momento para ter mais competitividade nas nossas exportações. É momento de ter calma, serenidade e entender as mudanças que estão acontecendo”, completa o executivo.

Com informações de g1.

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