Estamos no meio de bilhões de pessoas que habitam a Terra. E quase todas elas saem diariamente de casa atarantadas na procura de seus caminhos. Muitas buscam uma clarividência. Outras as evidências. Poucas a plenitude das vivências. Em todas as veredas andadas, encontramos a doçura do mel e o amargo do jiló que a vida nos oferece, excitando as papilas para a mistura de ambos. Mas os aprisionamentos do mundo espantam as misturas, são avessos às diversidades, forçando-nos à escolha entre o mel e o jiló. Como se fosse um jogo de binaridade infinitas, buscando a perfeição em saltos geométricos. Tanto um quanto o outro espelham a consciência de nossos limites. E dos limites da própria vida.
Hoje, não sou tão jovem, mas o amor como fruto do desejo me impulsiona para práticas libertárias, muitas coisas me juntam e me separam de mim mesmo, mas a resposta do que sentimos, somente a vida, um dia, aos poucos, me dirá. Estamos constituídos como humanos, engolidos pela poeira que se espraia pela rua abaixo. Às vezes, rua acima. Mas a poeira insiste em nos banhar. Estamos sempre engolfados por essa condição humana de estar vivo para a morte.
Não somos grandes nem pequenos. Agimos em relacionamentos que simbolizam uma força deles mesmos, sem sujeitos que os liguem. As relações quando esquecem os sujeitos evidenciam os seus laços, as linhas de uma tessitura que fazem redes de admiração. Entre as relações e dentro delas, há as fricções que fazem faíscas esquentarem corpos em um exercício de acolhimento dos diferentes, na busca silenciosa do calor. E, mesmo assim, a madrugada chega fria, negando a umidade do orvalho que teima em não molhar, afugentando as paixões, como se tivesse calando-se para o minuto do silêncio que afasta a paixão, mas que chama a amizade. Dizem que nesse minuto, num silêncio de que pena ao meio-dia, num cara a cara entre duas pessoas, numa troca de olhares sem constrangimentos, as amizades são paridas.
A vida, assim vivida, intensamente, nos encoraja aos amores e às amizades. Encoraja-nos aos enfretamentos do que se repete como uma sina a ser cumprida. Para, logo ali, nos fazermos em morte, numa valorização estupenda do cotidiano. Ter a consciência demasiada desse absurdo nos pode levar à criação, à conquista, ao encantamento de nós mesmos. E também dos outros. Pode nos levar à grandeza de sermos indiferentes às penas impostas por essa própria vida.
Até o trabalho insosso ou as relações cansadas, sem tempero, podem verter lágrimas pela face, minando as esquinas das bocas para descer goela a dentro, de gosto agridoce, meio animado, que se transforma em alegria para nos mover em ebulição nas fronteiras daquilo que somos: finitos, mortais.