Anderson Pires é formado em Comunicação Social – Jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.
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Não é apenas uma eleição
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Foto: Catarina Chaves/MEC – Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, com ex-ministro Ribeiro, são acusados de corrupção dentro do governo Bolsonaro

O Brasil não está apenas em um processo eleitoral. As eleições são o evento formal, parte da disputa democrática. Porém, estamos diante de uma decisão muito maior, o resultado eleitoral pode definir um novo marco civilizatório. As principais questões não são exclusivamente relativas à gestão político-administrativa do país. Mais que eleger o presidente, teremos qual modelo de civilização será escolhida.

Se adotarmos o discurso bolsonarista como parâmetro, que levanta  como justificativas para o voto a corrupção, a implantação do comunismo, a perseguição as igrejas, a ideologia de gênero e até que o destino do povo será o mesmo de países como a Venezuela, ficaria fácil estabelecer um debate em torno desses pontos.

No quesito corrupção, é absurdo imaginar que Bolsonaro seja exemplo para questionar qualquer político. Quando era parlamentar nunca fez qualquer movimento ou projeto para o combate à corrupção. Em entrevistas, chegou a confessar que era um contumaz sonegador. O patrimônio familiar é incompatível com a renda, vide imóveis bem acima do que seu salário e aposentadoria possibilitariam.

Não bastasse isso, a família Bolsonaro tem milhões a explicar em rachadinhas de funcionários, muitos deles fantasmas, compra de 51 imóveis em dinheiro, loja de chocolate com faturamento atípico, mansões em Brasília, dinheiro depositado na conta da primeira-dama, gastos secretos com cartão corporativo, favores para os filhos prestados por empresários beneficiados pelo governo e envolvimento com membros do crime organizado, como o miliciano Adriano da Nóbrega e os assassinos de Mariele Franco. É uma lista que derruba qualquer argumento sobre o combate à corrupção ser determinante para quem vota em Bolsonaro.

Se formos listar os atos de corrupção no governo, vamos perder as contas, talvez centenas de bilhões de reais. A começar pelos mais de 100 bilhões em jabutis implantados na privatização da Eletrobrás, mais os intermináveis recursos para o orçamento secreto, propina para pastores intermediarem liberação de recursos no MEC, liberação de licenças ilegais para madeireiros e garimpeiros, até gastos milionários com leite condensado, próteses penianas e viagra. 

O item corrupção é tão marcante na trajetória de Bolsonaro, que escolheu o PL como partido. O presidente Valdemar Costa Neto foi preso por ser réu confesso. Mas as más companhias não param por aí. Roberto Jeferson, Eduardo Cunha, Collor de Mello, Arthur Lira, Ciro Nogueira e mais tantos outros corruptos formam a lista de apoiadores do atual presidente. Para deixar ainda mais evidente o descaso com a legalidade, tem também assassinos e estupradores, como o Goleiro Bruno, o ator Guilherme de Pádua e o jogador condenado na Itália Robinho. 

No próximo ponto da nossa pequena lista, tem os que dizem votar para combater a ameaça comunista que Lula representa. Não sei o que realmente motiva esse tipo de desculpa: se burrice, desinformação, loucura ou falta de caráter. Durante 13 anos de governos petistas, tivemos o período em que o Brasil esteve mais inserido na economia global capitalista. Além de ter chegado a ser a sexta maior economia do mundo, o país que antes era um mero devedor do sistema financeiro internacional, passou a ser credor e sócio de um banco de fomento, o Banco dos BRICS. Imagine só que modelo de comunismo é esse, em que o governo tem como meta emprestar dinheiro a juros para outros países, transformar isso em ganhos financeiros e, também, ocupação estratégica de espaços no mundo. Lula só pode ser um maldito banqueiro comunista. Fez até lembrar um conto de Fernando Pessoa, O Banqueiro Anarquista, que queria combater o sistema sendo parte dele. Haja ficção.

Chegamos ao terceiro ponto, Lula irá perseguir as igrejas (evangélicas). Nesse quesito só posso imaginar que seja alguma ação de marketing para aumentarem as contribuições dos fiéis, ou como forma de pagamento para algumas benesses que Bolsonaro concedeu a empresários da fé, como RR Soares, Silas Malafaia, Edir Macedo entre outros. Imagine que nem IPTU mais as igrejas terão que pagar. O Estado é laico, mas a conta das igrejas quem tem que bancar é o povo. Alguns dos maiores grupos empresariais brasileiros são igrejas, com redes de rádio e TV, colégios, faculdades e negócios diversos. É óbvio que o único motivo que pastores têm para defender o voto em Bolsonaro é por interesse financeiro. Não existe nada de cristão em quem defende armas, violência, tortura, assassinatos, racismo, homofobia e uma série de práticas condenáveis pelo cristianismo.

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Vamos falar agora da mamadeira de piroca e outras mentiras criadas pelos bolsonaristas para tratar de um tema que existe apenas na cabeça deles, a ideologia de gênero. Além de farsas como o kit gay, banheiros unissex e treinamentos para a prática de sexo por crianças na primeira infância, existe uma verdadeira ação criminosa de quem tenta barrar o debate sobre gênero no Brasil. São os mesmos que acobertam estupros no âmbito familiar, que espancam mulheres e filhos, incentivam o racismo e a homofobia. Alguém que propaga a existência de uma ideologia por trás de temas que visam conter violências, na verdade quer um salvo-conduto para se eximir de atrocidades que crianças, jovens, mulheres e homossexuais sofrem diariamente. Para esses, aquilo que não se discute, não existe, mesmo que pratiquem.

O último ponto que iremos abordar é a falácia de que o Brasil irá se transformar numa Venezuela. Fosse verdade isso, por que durante todo governo Lula e Dilma essa realidade passou longe? Muito pelo contrário, em toda história do país, só durante os governos do PT tivemos a fome e a extrema pobreza erradicadas. O nível de desigualdade reduziu. Comer passou a ser um direito. A democracia e as instituições foram fortalecidas. Ao contrário do que vemos hoje, com todos os sinais de trânsito e portas de supermercados com pessoas pedindo comida ou algum tipo de ajuda. Os bolsonaristas fecham os olhos para fome e criam a farsa do perigo venezuelano. Na verdade querem esconder um país que produz comida que poderia alimentar 1,3 bilhão de pessoas, mas com milhões de famintos. 

É fácil perceber que nenhum dos argumentos do bolsonarismo se sustenta. Tudo que utilizam como justificativa é baseado em mentiras e exemplos contraditórios. Mas o que realmente motiva essa legião de eleitores de Bolsonaro? Como dissemos anteriormente, não é uma questão eleitoral, querem estabelecer um novo marco civilizatório. 

O debate não é sobre modelo econômico, eficiência na gestão, corrupção, educação, saúde, segurança e infraestrutura. Em nenhum desses quesitos existe parâmetro que prove que o Governo Bolsonaro foi melhor. O que une e motiva seus seguidores é a consolidação da moral bolsonarista. Quem vota na reeleição do atual presidente quer proclamar que ricos são melhores que pobres, que brancos são melhores que negros, que homens são melhores que mulheres, que héteros são melhores que homossexuais e que o sulista é melhor que o nordestino.

Isso é muito maior que eleger um governante. Querem estabelecer que na sociedade brasileira a civilização será regida pelo conservadorismo e preconceitos. Se o estado sempre serviu para amparar o capital, querem algo muito pior: respaldo para oprimir, matar e escravizar. Curiosamente, dizem lutar por liberdade, mas pregam que a opressão, a disseminação de mentiras e a segregação sejam práticas que devem ser institucionalizadas.

O bolsonarista é desumano e fundamentalista. Pregam o terror contra avanços humanitários. Esse é o elemento que unifica quem vota em Bolsonaro. Quem afirma que o comunismo e políticas de inclusão são um risco, quer na verdade implantar um estado autoritário, excludente e baseado na moral dos mercadores da fé.

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