Anderson Pires é formado em Comunicação Social – Jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.
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Quem matou George Floyd?
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Reprodução câmera rua

O mundo entrou em ebulição. Não bastasse a situação gerada pela pandemia do coronavírus, com milhares de mortes e todas as economias sofrendo impactos gigantescos, o assassinato de um homem negro por um policial branco nos Estados Unidos, pode ser a pólvora que faltava para que uma onda de protestos seja desencadeada em diversos países.

Mais que uma manifestação barbara de racismo, o episódio mostrou sem disfarces o quanto desumano ainda é o mundo e que muito pouco avançou na redução de desigualdades. A morte de George Floyd escancarou as diferenças e materializou o preconceito que vem sendo cultuado de forma tão intensa em países como Estados Unidos e Brasil.

A questão racial não é o único problema dessa ordem que vem crescendo nos últimos anos. A homofobia, a violência contra a mulher e ataques a povos mais vulneráveis estão tomando proporção alarmante, principalmente, quando são feitos com a condescendência dos governantes. O estímulo a violência a esses segmentos sociais é na verdade mais uma ferramenta de dominação, manutenção do capitalismo e instrumento de promoção da opressão e desigualdade.

Em pleno século XXI, muitos dos avanços humanitários que pareciam diminuir o grau de segregação no planeta, foram destruídos quando um policial, agente do Estado e branco tirou a vida de uma pessoa de forma deliberada, motivado pelo ódio racial. Basta ver, que não existia nada que justificasse a violência praticada e a evidente impossibilidade da vítima em produzir qualquer reação.

Apesar de tantas manifestações de movimentos identitários que, cada vez mais, ocupam espaços nas ruas e inundam as redes com as mais diversas formas de presença digital, tivemos um flagrante de uma realidade que parecia não ser mais tão grave como em outros momentos históricos. Parece antagônico que diante de um aparente avanço, episódios de racismo explícito aconteçam diante de câmeras e seja transmitido em tempo real pela internet. Tivemos a forma pós-moderna de assassinato em praça pública, nos moldes do que era feito pelos senhores de escravo e o Estado na época do escravismo.

Notem que isso aconteceu em um país onde o presidente anterior foi um homem negro. Aparentemente, o que se imagina de uma sociedade que proporciona a eleição de alguém vindo de parcela vulnerável, que isso deveria converte-se em mudanças conceituais e humanitárias. Por analogia, tivemos no Brasil um sindicalista, que foi sucedido por uma presidenta, porém, isso não significou a consolidação de avanços na proteção ao trabalhador nem a mulher.

E onde estaria o erro? Na minha percepção está no equívoco reproduzido por movimentos identitários, como também, por políticos que representam esses segmentos, com viés ideológico progressista, mas que colocam em segundo plano o enfrentamento geral. Priorizam ações segmentadas, que não produzem a quebra do regime de exploração que o capitalismo promove.

Parece evidente que o capital faz concessões para pacificar o mercado. Não querem estabelecer qualquer tipo de rompimento real com o modelo vigente. Em paralelo a expansão do identitarismo, também tivemos um aumento absurdo da concentração de riquezas. Nos momentos de crise essas diferenças suplantam as discussões sobre violência e preconceito. As mazelas que ficaram adormecidas, mediante a tranquilidade que o capitalismo precisa para manter sua expansão, são expostas com ainda mais crueldade que antes.

Engana-se quem pensa que mudanças de rótulos representam avanços sociais verdadeiros. Acreditar que combater preconceitos sem promover rompimento com a exploração capitalista tem algum efeito real, é não ter clareza do embate necessário. A armadilha construída em torno do identitarismo não estabelece um viés classista claro. Lembremos que as questões identitárias são um pleito de todos, sejam de direita ou esquerda, capitalistas ou não.

O episódio da morte de George Floyd toma proporções maiores que a questão racial. Porque a maioria da população mundial vive algum tipo de violência decorrente da exploração. Porém, é preciso que alguém estabeleça o debate classista, para que não tenhamos mais um novo processo de acomodação dos interesses do mercado. Acalmam as revoltas e continuam a marchar em busca de mais concentração.

Só teremos avanços realmente consolidados, quando houver mobilidade de classe e quebra do modelo econômico atual. O homem teoricamente mais poderoso do mundo, o presidente dos Estados Unidos, foi um negro. Parece esdrúxulo que seu sucessor seja um branco fascista. O que tinham em comum? A mesma estratégia: garantir a manutenção do capital e os ganhos dos capitalistas. Se com Obama o sorriso no rosto e a delicadeza sobressaíam. Com Trump sobra truculência e antipatia. Porém, apesar de serem de partidos adversários, estão do mesmo lado. E, podem ter certeza, ambos, de formas diferentes, alimentaram a disputa e a desigualdade que matou George Floyd.

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