Em um país que enaltece torturadores, quem alimenta os pobres é perseguido. Qual é o crime previsto para quem dá comida àqueles que sentem fome? O relatório “O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo (SOFI)”, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), mostra que a fome no Brasil piorou nos últimos três anos. Mais de 70 milhões de pessoas estavam em estado de insegurança alimentar moderada no ano de 2022 e 21,1 milhões em estado grave devido à fome.
É preciso fazer justiça para combater a fome. Conhecido pelo compromisso de prestar assistência a moradores de rua e menores abandonados no Centro de São Paulo, o padre da Paróquia de São Miguel Arcanjo, Júlio Lancellotti, defende que com uma mão se deve dar o pão e, com a outra, lutar. O religioso tem o compromisso de distribuir alimentos, cobertores e denunciar, por meio das redes sociais digitais, o que chama de ‘aporofobia’, o sentimento de aversão aos pobres. Entre eles os sem-teto, LGBTQIAP+ marginalizados, pessoas em situação de privação de liberdade e órfãos.
O ódio aos pobres também aparece nas ruas da maior cidade do Brasil. Em suas ações, Lancellotti quebrou pedras em viadutos na Zona Leste de São Paulo, presentes ali para impedir que moradores de rua usassem o espaço para dormir sob abrigo. Ainda que seja do Estado a obrigação de assegurar o direito à alimentação, moradia e bem-estar da população, políticos de extrema-direita utilizam da fé para propagar ódio e perseguir quem tem lutado na rua junto àqueles que mais precisam, como Lancellottti.
A Câmara de São Paulo cogita abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a partir de fevereiro, a chamada de CPI das ONGs (Organização Não Governamental), para investigar as ONGs que atuam na região da Cracolândia, com autoria do vereador Rubinho Nunes (União Brasil). O sacerdote está como alvo e a sua atuação nas áreas de vulnerabilidade social, ainda que o religioso afirme que não faz parte de nenhuma ONG, nem ter qualquer envolvimento com projetos que recebam dinheiro público. Em meio aos charlatões da fé, a intenção é perseguir um padre que realmente ajuda pessoas em situação de rua.
A extrema-direita persegue um homem que distribui alimento nas ruas. A medida eleitoreira está acima, portanto, de qualquer ensinamento bíblico, e é a atuação do padre que usa marretas para destruir a arquitetura hostil de São Paulo que incomoda. Por um lado, Júlio é exaltado pela coragem de seguir os passos de Jesus. Por outro, é demonizado.
Onde está o Cristo, senão entre os marginalizados?